terça-feira, 9 de agosto de 2011

Todo dia lemos nos jornais sobre crimes no Rio de Janeiro. É revoltante, amedrontador. Às vezes acontece com alguém que conhecemos. É triste e tal. Mas ainda está distante, irreal, é como se fosse filme de terror: quando acabam de contar a história você acende a luz e segue a vida.

Até que acontece com você!
Pronto. Você faz parte das estatísticas. Você foi vítima de criminosos encapuzados, agressivos e com cara de mau - maus de verdade! Gente ruim que não hesitaria um segundo antes de matar alguém ou coisa pior.

Os infelizes resolveram invadir um ônibus que levava trabalhadores cansados para casa, inclusive eu, às nove horas da noite, depois de um dia todo de trabalho, aulas na faculdade e outras atividades. Na noite fria e chuvosa os bandidos entraram no ônibus confortável, acortinado e de tarifa mais cara, usando apenas bermudas, chinelos e casacos de moletom com capuz. Tradicional roupa de bandido.

Óbvio que eram bandidos! Meu estômago se revira sozinho, alarmado, impotente, assistindo passar um, dois, três bandidos que sentam em lugares estratégicos do ônibus. Ao subir o viaduto que leva para a Ponte, quando não há mais nada que ninguém possa fazer, quando não há saída a não ser a pista expressa totalmente engarrafada, o bandido chefe anuncia o assalto.



O bandido-chefe saca a arma, desvia o ônibus para a Av. Brasil e começa a aterrorizar. O suco gástrico do meu estômago a essa altura já está corroendo minhas entranhas, e meu coração disparado pela adrenalina do medo me mostra o tamanho do meu terror. Impotente. Agora é só ficar quietinha, como diz o bandido, e sobreviver àquela tortura.

Demônio, o cabeça dos bandidos, comanda aos berros o assalto, fazendo Capeta 1 e Capeta 2 irem recolhendo os pertences dos passageiros. Eles sentam ao lado de cada passageiro e arrancam dinheiro, jóias, celulares e laptops. Alguns passageiros ficaram sem casaco também e houve quem tivesse a arma apontada para a cabeça. Tudo desnecessário, já que todos, apavorados, estavam colaborando. Mas isso faz parte do terror no qual os demônios e capetas se garantem para levar o que é nosso, fruto do nosso esforço diário e também nossa paz.

Minha cabeça girava pensando nas inúmeras maldades que eles podiam fazer com as pessoas do ônibus sequestrado enquanto o motorista dirigia pela Av. Brasil com uma arma na cabeça e muitas ameaças berradas aos ouvidos. Demônio e os Capetas não estão sozinhos. Comunicam-se por celular com seu bando de mais capetas, que acompanhava nosso ônibus em motos e um carro preparado pra fuga. Meu medo era o ônibus ser levado pra favela, onde poderiam fazer de tudo conosco!

Uma mulher derrama lágrimas, quietinha, e o bandido cisma com ela. Não entende, no auge de sua ação criminosa tão normal para ele, que a mulher tem medo, que o sistema nervoso dela está alterado após a última ameaça de puxar o pino da granada que ele fez. Ele grita, cheio de razão:

- Tá chorando por quê, senhora? Não estamos fazendo nada com a senhora! - e aponta a arma pra ela.

Isso! Não estão fazendo nada! Só aterrorizando, ameaçando de morte e torturando as pessoas com os palavrões, xingamentos e a violência. Para eles, já que não estão matando, não estão fazendo NADA. É para ficarmos tranquilos.



Os minutos pareceram uma eternidade e eu já sentia a minha nuca pulsando e o sangue avermelhando minhas bochechas, o coração descompassado e o corpo entorpecido, imóvel de medo. Acho que nem respirei. Um capeta sentou do meu lado e roubou meu telefone celular. Viu que na minha bolsa só tinha roupa de ginástica e cadernos e sentou logo no banco da frente para roubar o próximo passageiro. Cismou que ele era "polícia", mas logo viu, para o bem de todos, que não era.

Finalmente mandaram o ônibus parar no meio da pista, no Caju, e saltaram nos ameaçando de perseguição e explosão. O motorista seguiu pela Av. Brasil por um bom tempo na noite escura, de chuva fina e vento gelado. Fomos parar no Fundão, cabine da Polícia Civil vazia, nenhum policial militar nas vizinhanças. Impunidade. Impotência. Terror. Muitos tiveram que recorrer a conhecidos pois não tinhamos como voltar pra casa. Chamei meu pai para me resgatar.

Esses demônios levaram não só meu celular, os pertences de todos, mas também a minha paz.
Hoje, traumatizada, sinto dores no estômago toda vez que pego o mesmo ônibus para fazer o mesmo trajeto, naquele mesmo horário, como acontece todos os dias quando saio da faculdade após o trabalho.
Assisto a diversos outros assaltos pelas ruas do centro do Rio de Janeiro à noite, pela janela do ônibus. Sinto pavor. Quero chorar e fugir. Quero uma vida melhor. Mas a vida segue igual. E eles por aí, nos fazendo de reféns da sua maldade.

Semana seguinte.
Vejo num cantinho do jornal online uma notícia descrevendo exatamente o assalto pelo qual passei, mudando apenas o alvo, que era outra linha de ônibus cofortável que ia para Niterói. Nesse assalto, as pessoas ficaram feridas, levaram coronhadas... Ou seja, esse terror é habitual, acontece toda hora, comum, que não interessa às autoridades pois só tira do trabalhador comum e não tem destaque na imprensa porquê ninguém morreu de forma bizarra.

Isso é morar no Rio de Janeiro.
Isso é ser refém dessa cidade de demônios e capetas armados.

OBS: Escrevi o texto ontem, e ontem mesmo ocorreu um outro assalto desses no mesmo local onde ocorreu o meu e outro que citei em ônibus pra Niterói. Bizarro!

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