sábado, 20 de novembro de 2010

À medida que o tempo ia passando, Princesa percebia que Príncipe estava se distanciando dela e que não lhe brindava com os carinhos de sempre. Atribuía isso à onda de problemas pelos quais seu amado passava ultimamente. Era realmente um rapaz desafortunado, ela pensava, com mãezinha e filho constantemente doentes, saques ao seu tesouro pessoal e dores musculares resultantes das batalhas nas quais lutara bravamente no passado.

Mas ele era um homem de sorte pois a tinha por perto. Ela resolvia tudo com seu carinho, massagens com os cremes mais caros, amor eterno e seu tesouro... Enfeitiçada pelos encantos do príncipe, Princesa não poupava esforços (nem seu escasso tesouro) para agradá-lo. Cobria-no de presentes caros, levava-no a lugares elegantes e presenteava-no com seus pertences que ele dizia gostar. Queria ter de volta aquele homem encantador e feliz que conhecera. Sabia que podia ajudá-lo a atravessar os problemas. Seria sua escudeira fiel!



Porém os problemas do príncipe pareciam ter ficado piores pois ele não respondia mais às suas mensagens de pombo-correio. Pobre homem, deveria estar lutando suas batalhas e ocupado demais para vê-la. Claro que, ela acreditava que sempre que era possível, ele aparecia rapidamente para dizer a ela aquelas palavras de amor de que tanto gostava. Princesa achava pouco, queria mais. Queria poder cuidar de Príncipe, estar perto dele, sempre!

Era irresistível! Ela não podia mais viver sem ele, sem seus carinhos... mas sentia tanta falta, pois ele raramente aparecia. Coitado, quando vinha, só trazia problemas, e ela ajudava-no como podia.
Ele, por sua vez, ficava satisfeito e partia novamente.

Ela passou deixar de ver seus amigos, a não ir a festas e encontros, toda vez que Príncipe dizia que a encontraria. Mas ele raramente podia vir, pobrezinho. Tão ocupado... E ela ia ficando sozinha e triste.

Até que um dia ela quis deixar de ser Rapunzel. Resolveu sair de sua torre e ir ao encontro de seu amado, afinal ela era uma mulher moderna, apesar de princesa cor-de-rosa, e podia cavalgar sozinha pelo bosque até encontrá-lo.

No caminho seus amigos e os animaizinhos silvestres lhe vinham com notícias assustadoras, de que o príncipe não era realmente um príncipe. Seria possível que ele estivesse lhe faltando com a verdade?
Não!!! Claro que não!
Ela não duvidava de seus amigos, jamais, mas deveria haver alguma explicação.
Ele era um homem batalhador! Ou nao era? Ele era um gentleman... Ou não era? Ela a amava... ou não?....

Seu coração levemente magoado, se apertou ainda mais ao finalmente encontrar seu príncipe. Ele acabava de soltar um pombo-correio pelos ares que ela reconheceu como dela própria. Ah, que lindo! Ele deveria estar enviando de volta uma mensagem de amor para ela! Seu sorriso se iluminou.
Passou então a reparar nas roupas de Príncipe...
Nossa, ele estava com uma aparência ótima! Mais elegante, mais arrumado, mais sorridente. Bem melhor do que quando ela o conhecera!

Que bom! - pensou - Deve ser efeito das minhas atenções e as crises devem ter passado. Ficara sabendo que sua família ia bem. Mas, ao pensar nisso, imediatamente lembrou-se dos avisos dos amigos e não foi capaz de conter a enxurrada de  pensamentos que invadiram sua cabeça: "por quê será que ele estaria andando arrumado assim se não sabia que iria me encontrar?", "como pode estar tão bonito se tudo que me contava sobre sua vida eram misérias e dramas?", "para quem seria aquela mensagem, já que o pombo-correio não voara até mim?". Dúvidas... E ela tinha medo das respostas.
Sua alma se inquietou e ela resolveu questioná-lo.



Ele respondeu friamente:
- Ah, Princesa! Preciso lhe contar a verdade... 
Princesa sofreu calada, e esperou que ele terminasse, com os nervos tensos.
- Sabe, depois de tudo que passei, estou recomeçando minha vida e preciso andar sozinho. Seus carinhos e ajudas foram muito importantes, mas agora preciso ir. Preciso cavalgar sozinho pela vida e descobrir alegrias.

Atordoada, como se tivesse levado um soco no estômago ela perguntou:
- Mas... mas... Buscar alegrias? Outras que não nos meus braços? O que houve? Eu não te trago alegrias?!
Lágrimas começaram a se formar nos seus olhos e seu coração estava se contorcendo como roupa molhada antes de ser estendida na corda. E ele finalmente lhe cravou um punhal no peito quando respondeu:
- Você é um luxo, Princesa. Realmente uma mulher e tanto! Mas eu não sou para você. Acabei de me separar e não quero estar com uma mulher só. Quero experimentar várias e me divertir muito. Você já serviu aos seus propósitos, mas fiquemos amigos.

Ela estava completamente aturdida. Seu corpo estava dormente, sua cabeça latejava e mal podia ver Príncipe através da cortina d'água que se formara em seus olhos. Seu coração sangrava, ela podia sentir, descompassado dentro do peito, querendo sair pela garganta, mas tudo que saiu por sua garganta foi:
- Bem, amor, se é isso que te faz feliz, eu entendo... Siga seu caminho e fique bem. Saiba que pode contar comigo sempre!

Ficou perplexa consigo mesma! Tinha acabado de levar um fora, e ele fora grosseiro, como se nada do que viveram tivesse tido valor.... Como assim "eu entendo?!" Que diabos ela tinha dito?!
Por quê não gritou com ele e o xingou como ele merecia? Por quê não disse a ele que se sentia magoada, que não era justo o que fazia com ela? Por que diabos ele merecia sua polidez e carinho quando tudo que tinha feito era mentir e mentir? Fizera-na viver uma mentira!!!! Só a usara para se erguer novamente! Servia inteiramente a seus próprios interesses, egoísta e cruel!

Enquanto escutava a multidão de vozes em sua cabeça dizerem o que devia falar alto, assistia Príncipe pegar o cavalo dela, que de tanto ser emprestado ele já tinha dominado, e sair pelo bosque deixando-lhe apenas um sorriso amarelo de lado. Sem mais explicações. Seu romance acabara assim!



Princesa arrastava-se pelas árvores, apoiada nas mãos para não tropeçar e cair. Seu peito aberto sangrava largos rios. Seu coração apertava e ela sentia dor demais. 
Não tinha mais condições de andar, então sentou, abraçou os joelhos e soluçou intensamente.
Sentia-se morta por dentro, apunhalada pelo maldito homem.
Como podia ter estado errada todo aquele tempo? Como podia ter sido tão boa para ele e não receber nenhum tipo de reconhecimento no final? Como pôde não enxergar o que estivera sempre tão claro na sua frente: o príncipe era apenas um sapo comum, daqueles do brejo, bem asquerosos e grudentos, talvez até venenosos... letalmente venenoso.

A raiva tomava seu peito dolorido e ondas de dor se espalhavam pelo seu corpo enquanto chorava compulsivamente.
Não compreendia! Com seus amigos não era assim. Ela sempre era boa, e colhia bondade; se era caridosa, colhia carinho; se era generosa, recebia de volta apoio e ajuda sempre que precisara... E agora aquilo?! Como podia não ter visto? Como ficara tão cega a ponto de ser uma das vítimas dele? Era óbvio que ele era um mundano profissional... devia fazer isso com várias mulheres ao longo do caminho!

Estava tudo claro agora!
Seu distanciamento + suas desculpas + sua renovada aparência e felicidade = outra mulher!
O pombo-correio (dela) certamente voara para outra dona com uma falsa mensagem de amor! "Seu" príncipe encantado cavalgara com o cavalo dela para os braços da outra! E o perfume que comprara para ele, e que sentira nele agora pouco, ele usava para encontrar outra mulher! Que humilhação sentia!

Agora as nuvens se dissipavam em seu cérebro e ela lembrava das imagens do castelinho de merda dele e do pântano onde morava. Juntava isso às palavras que ouvia-no dizer às vezes, usando um linguajar que não era apropriado para um príncipe e o fato de que não podia morar num pântano se realmente fosse um príncipe... Burra!!! Ele era profissional de carreira e a tinha infectado com seu veneno! Puramente falso! Aproveitador de donzelas carentes e independentes! Como ela pudera ser tão cega, tapada, idiota?

Tudo aquilo era um conto de fadas às avessas....
Aquela parte do romance que ninguém lê...
Mentiram para ela quando menina: a história não acaba no "foram felizes para sempre"...
E agora ela estava extremamente triste... e provavelmente para sempre!



CONTINUA NA POSTAGEM "CONTO DE FADAS - O QUE NINGUÉM CONTA III"

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